O Brasil é o maior produtor e exportador de café no mundo. Entretanto, apesar da fama do grão no mercado internacional, há uma lenda que prejudica a imagem do produto dentro do país. Afinal, há quem diga que o café brasileiro é impuro – pelo menos o comercializado no mercado interno. Nesse sentido, o programa EP Agro, da EPTV, afiliada da Globo, visitou a Cooxupé para descobrir a verdade sobre o café torrado e moído vendido nos supermercados.
Etapas do grão
Antes de mais nada, por muitos anos, o grão brasileiro tinha a fama de ser impuro. E, ainda, muito torrado pela indústria nacional para esconder os defeitos da bebida. Para entender como é todo o processo de recebimento do café e sua classificação, a equipe de reportagem do EP Agro esteve na maior cooperativa de café arábica do mundo.
Em período de safra, pois, a Cooxupé recebe mais de mil sacas de café por dia. Tudo passa por um processo de classificação e prova antes de seguir para a exportação ou para a indústria torrefadora nacional.
Primeiramente, os grãos passam por uma análise. Nesta etapa, há dois modos: o manual e a classificação por máquinas. Assim, no manual, separam a mão cada grão, sendo a análise considerada mais precisa e eficaz. Por outro lado, a classificação com as máquinas está em fase de testes no país.
Legislação
A legislação brasileira permite que o pó de café tenha até 1% de impurezas naturais e de matérias estranhas. Dessa forma, impurezas que ultrapassem esse limite desclassificam o produto para consumo e proíbem a sua comercialização. Inclusive, a portaria que regula essas regras está em vigor há dois anos.
De acordo com Celírio Inácio da Silva, diretor da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), até então só existia lei para alimentos, mas nada específico para o grão.
“Por isso, a Abic fazia o monitoramento do mercado e apresentava ao Ministério Público todas as denúncias dos produtos que estavam inadequadamente expostos à disposição do consumidor. Só que, como não havia uma lei específica, o Ministério Público também não tinha como agir. Portanto, há dois anos, houve uma regulamentação junto do Ministério da Agricultura”, explicou.
Impurezas e defeitos

Dessa forma, a legislação considera impurezas: casca, pau e pedra. Já defeitos são os grãos imperfeitos, pretos, mal granados, quebrados, brocados e ardidos.
Portanto, na Cooxupé, o café dos cooperados passa por mais uma etapa, a classificação. “Pesamos 100 gramas do café de cada produtor e tiramos todos os defeitos e as impurezas. Quando dá, por exemplo, um percentual de 20% de catação, descontamos 20 gramas da saca do produtor. Assim, defeito é o que faz ele perder valor em sua safra. Já a impureza é algo extra café, não é bebível e não é bom nem para o mercado, nem para o cafeicultor”, detalha Eduardo Leite, degustador e classificador de café da cooperativa.
Em seguida, dentro da classificação vem a fase de torra. Segundo Vanessa Martins, assistente de classificação de café da Cooxupé, os lotes chegam demarcados. “Colocamos cerca de 100 gramas em um coletor de amostras, passamos para o torrador e aí acontecem algumas fases. Como, por exemplo, a perda de água. O café fica mais verde, depois amarelo e os grãos começam a expandir até chegar na cor exata. São cerca de três a cinco minutos. Quando vemos que o grão expandiu e está na cor esperada, ele está pronto. Tiramos do torrador e abanamos para tirar as películas que ficam”, ressalta.
Prova do café

Depois, chega a fase de prova da bebida. Em primeiro lugar, realizam essa etapa em duplas, para ter mais de uma opinião. Na Cooxupé, os profissionais provam sete xícaras por lote de café e, em cada mesa, são 18 lotes por vez. A temperatura ideal da prova é de 40 graus.
“Pegamos os cafés que passaram pelas outras etapas e provamos, para saber qual é o tipo da bebida e se é um café que ‘bebe duro’. Ou seja, se é uma bebida limpa, sem fermentação, que não tem sujeira e com nuances. Portanto, é um bom café, apreciado e gostoso de se tomar”, define Renato Henrique Silva, degustador e classificador de café da cooperativa.
Além disso, eles avaliam alguns fatores sensoriais. Como a doçura, por exemplo. “Alguns cafés têm uma doçura mais alta e outros têm acidez marcante. Outros têm corpo que preenche a boca da gente, que dá prazer em beber. Tem bebidas que a gente prova e parece até que fica um sabor de leite no paladar. Essas são as nuances que a gente vê aqui”, afirmou Renato.
Qualidade do produto
Ao final, tudo é anotado para o consumidor final ter a rastreabilidade do produto, além de um feedback ao produtor. Também é neste momento que os degustadores percebem se o café é tradicional, se tem qualidade superior ou, então, se é especial.
“Quando percebemos que o produto tem potencial para ser especial, o lote é separado e enviado para a SMC Specialty Coffees, a casa de cafés especiais da Cooxupé”, completa o degustador.
Porém, pode ficar a dúvida: o café tradicional, que o consumidor encontra nos supermercados, também passa por todo esse processo?
Dessa forma, Renato responde que sim. “A gente degusta e confere se a bebida é boa. Quando é um lote de qualidade, a Torrefação Cooxupé compra e destina para o consumidor final, seguindo o padrão exigido pela Abic”, finaliza.
Afinal, o café brasileiro é impuro?
Em suma, através dos processos realizados na Cooxupé, foi possível entender a classificação do café até a venda ao consumidor brasileiro. E, assim, é possível afirmar que o grão produzido e vendido no país tem segurança alimentar e qualidade. Portanto, o café brasileiro não é impuro.
“Até chegar à xícara, a gente faz todo esse processo de classificação e prova para atender a cada cliente de acordo com a sua exigência. Portanto, é importante passar para o nosso consumidor que o que tem de bom do produto também fica para o mercado interno. Não é só lá fora que se bebe café brasileiro de qualidade. Aqui no Brasil também tem muito grão bom”, garante Silvio César Mussara Silva, degustador e classificador de café da cooperativa.
Tudo começa na lavoura
Por fim, um produto de qualidade também traz benefícios ao cafeicultor. Afinal, quanto mais ele se preocupar com o pós-colheita e produzir um café para atender às exigências do mercado, mais agrega valor ao seu produto. E, assim, tem um retorno financeiro melhor.
De acordo com Silvio, para ter um café livre de impurezas, o processo começa no campo. “Isto é, com o pós-colheita bem feito, com maquinário limpo e com o conhecimento técnico de quem está tomando conta de terreiro, lavador e secador”, concluiu.